Patricia Finotti

Eixo Anhanguera, Centro, cruzamento com a Avenida Tocantins, seis da tarde. A espera por um espaço no ônibus leva bons minutos do trabalhador que aguarda, cansado, o próximo e o próximo. Depois de um dia exaustivo, este é apenas o começo de uma longa viagem que ainda deverá passar por, no mínimo, dois terminais antes de chegar em casa, fazer janta, cuidar das crianças e se preparar para fazer o trajeto de volta no dia seguinte.

Na plataforma, a única coisa que resta é a espera. Ver os carros passando, os pedestres do outro lado da rua, o comprador de ouro pegando seu banquinho, alguns resquícios da beleza Art Déco goiana escondida atrás da poluição visual das marquises do Centro.

Finalmente dentro do ônibus, o caos se faz diante dos olhos e dentro dos ouvidos. O barulho das imagens é tão alto quanto o das buzinas e dos freios. A bagunça aumenta o cansaço. Outdoor, folheto, placas, letreiros, luminosos. Não há onde repousar os olhos. Fecha, olha pra baixo, para o teto. Tentativas vãs de fuga.

Ao chegar ao terminal, uma sensação inesperada de paz! Uma imagem provoca o arrebatamento. E outra. E outra! São 50 que, ainda que apenas por alguns instantes, faz a cabeça parar e se inundar de uma emoção diferente de todas aquelas. E as imagens reverberam. A paz de quem se encontra com a arte.

A exposição

Esta é a proposta do Céu de Anil, projeto do fotógrafo e produtor cultural Wagner Araújo, que vem modificando a maneira como o goianiense lida e consome fotografia, elevando a oitava arte a um patamar diferenciado, ainda que os holofotes sejam os faróis das ruas ou dos ônibus.

Céu de Anil foi lançado neste domingo (03), nos terminais Padre Pelágio e Praça da Bíblia, onde 50 imagens irão compor uma grande exposição pública e gratuita. São imagens de qualidade elevadíssima que têm como curador ninguém menos do que o ex-curador da Pinacoteca de São Paulo, Diógenes Moura.

Pertencimento e ancestralidade

As 50 fotografias foram feitas por Wagner Araújo entre os anos de 2005 e 2016 numa série que aborda as profundas manifestações de arte e religiosidade goianas e brasileiras a partir de uma visão poética e não apenas documental. As imagens revelam a miscigenação e pluralidade do povo brasileiro, suas manifestações culturais, e propõem uma reflexão sobre nossa ancestralidade, uma série que busca resposta para questões definitivas: De onde viemos? Quem somos? Para onde vamos?.

“Num momento em que o Brasil está à beira, nada mais precioso do que poder observar a nossa matéria, corpo e alma, lutando para preservar o que temos de mais significativo: as nossas manifestações culturais, públicas, espelho de um povo brasileiro e goiano que não tem medo de se ver refletido no espelho da existência, da memória”, ressalta Diógenes Moura, que recentemente realizou a curadoria do Goyazes Festival de Fotografia, em Goiânia.

Moura explica que Céu de Anil, por meio das imagens de Wagner Araújo, sugere um instante de reflexão no trânsito dos terminais rodoviários, justamente no fluxo do dia a dia onde cada um dos transeuntes que por ali passam, param e seguem adiante têm a possibilidade de olhar para si mesmo e rever o que lhes pertence: a Cavalhada em Pirenópolis, as Congadas em Goiânia e Catalão, os retratos dos índios Kayapó, Krahô e outros nos encontros de cultura na aldeia Multiétnica em São Jorge e Alto do Paraíso, a louvação à Yemanjá, lá mais adiante, na Baía de Todos os Santos, na praia do Rio Vermelho, em Salvador, na Bahia.

“Porque o que é nosso, nos pertence, não se apaga, não se lastima. Pertence porque trata da nossa história. Pertence ao nosso corpo, ao conflito permanente entre dor e prazer que temos que enfrentar diariamente. Aqui está o Céu de Anil. Eis a nossa liberdade para existir, cantar, dançar, entrar em transe, e gritar, cada vez mais. Simplesmente porque somos vencedores”, ressalta o curador, enfático.

Céu de Anil foi contemplado pelo Fundo de Arte e Cultura do Estado de Goiás 2016, do Governo do Estado de Goiás por meio da Secretaria Estadual de Educação, Cultura e Esporte (Seduce), e fica em cartaz até 03 de fevereiro. (Taynara Borges)

Serviço
Exposição Céu de Anil
De 03/12/17 a 03/02/18
Terminais Praça da Bíblia e Padre Pelágio
Fotógrafo Wagner Araújo
Curador Diógenes Moura

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